Estamos cercados pela indústria cultural americana. Ela está em toda parte: Hollywood, desenhos animados, seriados de TV, best-sellers, hits musicais, palavras em inglês. Parece até o que o nosso país foi invadido. O fato é: a cultura americana praticamente domina sobre o cultura brasileira. Absurdo, não? E o pior de tudo é que essa dominação é realizada com a ajuda do próprio brasileiro. Já cansei de ouvir amigos dizendo coisas como "filme nacional é horrível" e "não vou ler este livro, o autor é brasileiro". Isso me deixa indignado. O brasileiro é vítima e cúmplice da subjugação cultural, não conhece bem a sua cultura e adora ressaltar os aspectos positivos das coisas vindas do exterior. Enquanto isso, um verdadeiro tesouro nacional espera para ser descoberto e valorizado. Escrevi este texto para compartilhar com vocês um pouco da maravilhosa cultura do Brasil.

Livro: O Seminarista - Rubem Fonseca.

José Joaquim Kibir é descendente de portugueses, versado em latim, torce para o Vasco da Gama, prefere comer em restaurantes baratos, adora filmes clássicos, ler - especialmente poesia - e escutar um bom rock. José é o melhor no que faz. Ele é assassino de aluguel, e entende tudo sobre armas. Também é um ex-seminarista, tendo entrado na vida religiosa por vontade da mãe e sendo expulso pelo desejo pelas mulheres - especialmente as magras, de seios pequenos, e que não pareçam promíscuas. Seu contratador, o Despachante, sempre arranjou muitos trabalhos, dando para ele uma estabilidade suficiente para seguir a vida. Um dia, ele decide se aposentar, porém largar a vida de Especialista é mais difícil do que ele imagina.

Alguém está atrás do Despachante e do Especialista, e está disposto a tudo para vê-los mortos.  É nesse meio que José encontra o amor pela primeira vez, com Kirsten, uma jovem alemã, tradutora de livros, fã da boa culinária e da poesia, cujo filme favorito é Laranja Mecânica. Idas e vindas com assassinatos, espionagem, tortura, manipulação, sexo, literatura, frases de escritores latinos, reencontros com os seus amigos - D.S. e Sangue de Boi - e um final surpreendente garantem a diversão.

Claro que não é de bom-tom falar sobre  a obra é esquecer o autor. O mineiro Rubem Fonseca é um dos maiores escritores brasileiros da atualidade, vencedor do Prêmio Camões - espécie de Nobel da Literatura dos países lusófonos -, Prêmio Juan Rulfo e cinco vezes do Prêmio Jabuti. É autor dos livros Agosto e Feliz ano novo. Sua estética é brutalista, tendo a violência e o sexo como temas recorrentes. De acordo com o diretor do Departamento de Estudos Latino-Americanos da Universidade de Iowa,  Thomas Waldemer, "Rubem Fonseca é provavelmente o escritor vivo brasileiro mais estudado fora do Brasil. Tomando-se a literatura brasileira de todos os tempos, talvez ele só perca para Clarice Lispector. Ele é hoje considerado um mestre da ficção policial em escala mundial, e seus livros fazem parte do cânone da literatura latino-americana".


Filme: Saneamento Básico, o Filme - Jorge Furtado.

Tudo bem, o título pode até não ser lá muito chamativo, mas garanto que é um filme muito divertido. Já tinha ouvido falar dele algumas vezes, mas, por causa do nome atípico, nunca havia corrido atrás para assistir. Porém, depois de ler mais sobre a obra de Jorge Furtado, achei a história bem inovadora, super criativa, e tive que assistir o filme. Depois de muitas gargalhadas, não podia deixar de compartilhar com vocês.

A história é mais ou menos assim: em uma pequena vila sulina de descendentes de imigrantes italianos chamada Linha Cristal, os moradores se reúnem para requerer à prefeitura obras de saneamento básico para a vila, que só possuía uma vala aberta. A prefeitura, porém, só dispunha de verbas para fazer um filme. Um filme de ficção. E, por ironia do destino, a verba para fazer o filme era exatamente a mesma verba necessária para a construção da fossa da vila. Marina (Fernanda Torres), representante dos moradores de Linha Cristal, decide aceitar o dinheiro do filme e, junto com o seu marido Joaquim (Wagner Moura), bolam um plano mirabuloso: eles irão utilizar o dinheiro para construir a fossa e, enquanto isso, vão filmar um filme estrelado pela irmã de Marina, Silene (Camila  Pitanga),  e filmado pela  câmera  do  namorado de
Silene, Fabrício (Bruno Garcia), em que um monstro que habita uma fossa em construção aterroriza a população de uma pequena cidade. É literalmente um filme sobre fazer um filme. Roteiro e direção de Jorge Furtado. Participação especial de Lázaro Ramos.

O cineasta Jorge Furtado já foi homenageado diversas vezes, não só no Brasil, como na Europa. Dirigiu os filmes Meu Tio Matou um Cara, O Homem que Copiava e Houve uma Vez Dois Verões e o curta Ilha das Flores. A sua obra é marcada pela diversidade, a qual comprova que o cinema brasileiro não é feito apenas de  favela, miséria, violência, praia e índio.


Música: Tom Jobim, Elis Regina e Chico Buarque.


Bem, comecei falando de algumas coisas mais modernas. Agora, vou ser um pouco retrô. Algumas das minhas paixões são a Bossa Nova e a MPB (é, talvez você esteja pensando "ele gosta de música de velho"). Vou apresentar pra vocês alguns dos meus cantores favoritos.

Antônio Carlos Jobim, o Tom, é considerado pela crítica especializada o maior músico brasileiro de todos os tempos. Foi um dos fundadores da Bossa Nova. Compôs, com Vinícius de Moraes, a segunda música mais ouvida de todos os tempos, Garota de Ipanema (a famosa "olha que coisa mais linda, mais cheia de graça, é ela a menina que vem e que passa..."), perdendo apenas para Yesterday dos Beatles. Quem acompanha  The Big Bang Theory conferiu, na última temporada, a interpretação da música no seriado, na sua versão em inglês, The Girl from Ipanema. No dia 25 de janeiro de 2011, dia em que Tom completaria 84 anos, o Google o homenageou com um de seus doodles comemorativos.

Elis Regina é conhecida como a maior cantora brasileira de todos os tempos. Se aventurou tanto na Bossa Nova quanto na MPB, e por vários outros estilos musicais, como ela mesma disse: "Cantar, para mim, é sacerdócio. O resto é o resto". Ela sabia levar a música a sério e, ao mesmo tempo, ter senso de humor e sentimento. Dentre as suas músicas mais conhecidas (e uma das minhas favoritas) está O Bêbado e a Equilibrista.  É mãe da cantora Maria Rita, a qual também admiro. Faz exatamente trinta anos que estamos sem Elis, que teve uma morte digna de estrela do rock: overdose de cocaína.

Francisco Buarque de Hollanda é um músico, dramaturgo e escritor que eu admiro MUUUUITO. Acho que todos já devem ter escutado na aula de História antiga como se mirar no exemplo daquelas Mulheres de Atenas, influência do pai de Chico, Sérgio - um grande historiador brasileiro -, na sua obra. O jogo de palavras permutando em Construção é fantástico. Isso sem falar de quando a gente está à toa na vida e nosso amor nos chama pra ver A Banda passar, cantando coisas de amor. Tive o prazer de ler dois dos livros de Chico, Budapeste, livro extremamente elogiado pela crítica - foi elogiado pelo José Saramago, multinversers, o José! - e adaptado para o cinema por Walter Carvalho (filme muito bom, aliás), e Leite derramado, que, diga-se de passagem, devorei em uma tarde e é o meu favorito entre os dois.


Espero que tenham gostado desse projeto de resgate da cultura nacional. Deixo vocês com a versão de Águas de Março cantada pelo Tom e pela Elis e A Banda do Chico. Até a próxima.

Águas de Março

A Banda