"Este é um livro francamente terrível com o qual eu quero que o leitor sofra tanto como eu sofri ao escrevê-lo. Nele se descreve uma longa tortura. É um livro brutal e violento e é simultaneamente uma das experiências mais dolorosas da minha vida. São 300 páginas de constante aflição. Através da escrita, tentei dizer que não somos bons e que é preciso que tenhamos coragem para reconhecer isso."  - José Saramago

É com esse depoimento acima que eu quero apresentar a vocês um dos meus livros favoritos. *-*  E para quem ainda não leu, por favor, não se assuste.  =)

Recomendado por uma amiga, Ensaio sobre a cegueira foi o primeiro livro que li do autor português José Saramago. Desde então, não consigo parar de apreciar outros trabalhos seus, simplesmente me tornei fascinada pela sua escrita.

Nessa obra, sem nenhuma explicação, um homem fica cego. No entanto, não é aquela cegueira comum que conhecemos, na qual tudo é escuridão. Ao invés disso, surge uma cegueira branca. É o mesmo que acontece quando você olha para o sol, mas não consegue visualizá-lo por muito tempo por causa da sua luz forte. Porém, isso não te impede de olhar, mas sim de enxergar através da luz. O pior de tudo é o fato dessa cegueira ser contagiosa. Aos poucos ela vai se propagando até tornar-se uma epidemia. Toda uma nação fica cega. Exceto uma mulher. A única que consegue observar todo o caos.

É um livro com muita intensidade. Tem toda uma crítica contra a forma que a sociedade se comporta diante do mundo. O homem é colocado no seu estado mais cruel. Os princípios morais, para muitos personagens, deixam de ser importantes em um lugar onde ninguém vê o próximo. É mostrado o quanto o ser humano é frágil. Não conseguimos viver e sobreviver sozinhos. Entretanto, no meio desse horror todo, a solidariedade e a esperança não deixam de existir.

Todos temos os nossos momentos de fraqueza, ainda o que nos vale é sermos capazes de chorar, o choro muitas vezes é uma salvação, há ocasiões em que morreríamos se não chorássemos.


Geralmente, a escrita do Saramago é considerada difícil, pois ele tem o seu próprio modo de escrever, mas nada que um pouco de concentração não resolva (rs). Confesso que não foi fácil lê-lo, pois, além de possuir partes fortes, você acaba sentindo um pouco do pânico dos personagens, é como se estivesse vivendo essa história. Como vocês perceberam, não é uma história feliz, no entanto, o que ela transmite para o leitor faz com que a leitura se torne incrível.

"O livro é apenas uma pálida imagem da nossa realidade. A verdade é que o instinto dos animais defende melhor a vida do que a nossa razão, que, pelo contrário, tem servido para dominar, humilhar, explorar o outro. É evidente que o mundo é violento, não há nada a fazer. Mas nós acrescentamos à violência a crueldade, que é uma invenção humana. Portanto, às pessoas que diziam não suportar a leitura do meu livro, eu respondo com a pergunta: vocês não conseguem ler este livro, mas conseguem viver neste mundo?"
- José Saramago

Filme

Depois de muito tempo, Saramago liberou os direitos de sua obra para filmagens. O filme foi dirigido pelo brasileiro Fernando Meirelles, famoso pelos seus trabalhos em Cidade de Deus e O Jardineiro Fiel (que, por sinal, são muito bons).

Primeiramente, uma das coisas que admirei bastante foi a trilha sonora feita pelo grupo brasileiro Uakti cuja suas músicas são instrumentais e criam os seus próprios instrumentos, com tubos de PVC, por exemplo, simplesmente incrível. 

“A idéia de fazer a trilha com o Uakti foi justamente trabalhar com timbres desconhecidos, com o intuito de colocar o espectador num universo sonoro tão novo quanto o mundo da cegueira.” -Fernando Meirelles
                                                                                                                                               
Acredito que o filme foi bastante fiel ao livro, tanto que nele o Meirelles também não se preocupou em achar uma cura para a cegueira. Então, provavelmente, quem leu o livro e gostou, também irá amar o filme assim como eu.  =)
Fizemos dos olhos uma espécie de espelhos virados para dentro.